A liquidez de valores e a vivência ética
Cláudia Gomes S. Rodrigues*
Vivenciamos tempos de muita
informação, rápidas comunicações e, consequentemente, nossa “caixa de
ferramentas” para a convivência social nem sempre traz utensílios apropriados
para este uso.
Já bem disse Adélia Prado que “sem o
corpo a alma não goza”, verdade. O nosso corpo é a morada de nossos desejos,
nossas angústias e determinações; é aí que se encontra a alma - revestida de
valores - que possibilitam o gozo da vida, ou não.
É exatamente aí, nesta “alma”
guardada em um corpo, que moram os meus questionamentos: em um mundo de
moralidade líquida, desejos e necessidades que se distanciam, onde o gozo da
realização nem sempre está próximo aos comportamentos de alteridade,
solidariedade e cidadania, como vivenciar um profissionalismo ético?
A sociedade mundial, vivenciando a
globalização econômica, política e moral, muitas vezes esquece-se que as partes
– individualidades – constroem o todo que a maioria vê. Além do “jeitinho
brasileiro” (poder não pode, mas sempre se dá um jeito), existe uma postura de
defesa aos conceitos e normas vivenciadas em uma sociedade de princípios
líquidos que tomam a forma que lhe apresentam. Isto é ético?É imoral?É preciso
diferenciar ética e moral: Pois esta é um conjunto de regras estabelecido
socialmente e aquela se ocupa da reflexão sobre os princípios que norteiam a
vida social; assim, é questão ética discutirmos a liquidez dos valores morais.
A dinâmica social nos atribui cargos
e funções, aos quais vivenciamos mediante a valoração que fazemos ao
estabelecermos relação com o objeto valorado e estabelecermos um juízo de
valor; este valor está intimamente associado ao conjunto de regras sociais; temos
a moral.
Estabelecida uma dinâmica de valoração é
preciso refletir sobre a crescente ideia de liquidez da sociedade política,
econômica e a relação interpessoal atual. O confronto contínuo entre a moral
constituída – valores herdados - e a moral constituinte – crítica aos valores
ultrapassados, nem sempre garante uma progressão moral, nem uma vivência ética.
Uma pessoa só justifica sua presença ética a partir do momento em que é consciente
de si e dos outros; é dotado de vontade, controlando seus desejos e tendências;
quando é responsável, respondendo por seus atos e, finalmente, quando é livre,
dando a si mesmo as regras de conduta.
É necessário um corpo para o gozo da
alma, isto justifica a urgência do bom uso das “ferramentas” para a
concretização de nossos desejos; a polêmica está no fato de que a sociedade
vigente apresenta princípios líquidos que tomam formas tendenciosas, nem sempre
defendidas pela maioria; maioria que se cala não por falta de informação, mas
de conhecimento, sobre o real e ideal
uso das “ferramentas” da sociedade.
A vivência ética nesta sociedade de
princípios líquidos exige uma “caixa de ferramentas” que ao ser aberta traga:
responsabilidade, lealdade, honestidade, sigilo, competência, prudência,
coragem, perseverança, compreensão, humildade, imparcialidade, otimismo e
disciplina.
É no uso destas “ferramentas” que o
sujeito ético torna-se um cidadão, um profissional que constitui uma existência
ética, que independente da liquidez dos ideais a ele propostos, irá adequá-los
às formatações que seus valores morais lhe apresentam.
Saber o que está em nosso poder, não
nos deixarmos leva pelas circunstâncias, instintos ou vontades alheias, afirmam
nossa independência e autodeterminação – traça nossa conduta ética.
*Professora com experiência do Fundamental I à graduação,
lecionou filosofia para cursos de formação de professores; especialização em
psicopedagogia e mestranda em educação.
Recursos
Bibliográficos:
ARANHA, Mª
Lúcia de Arruda e Mª Helena P. Martins- Temas de Filosofia – Ed. Moderna
CHAUÍ,
Marilena – Convite à Filosofia, Ed. Ática, 1995. Filosofia -
Ed. Ática, 2000