domingo, 9 de setembro de 2012


A liquidez de valores e a vivência ética


Cláudia Gomes S. Rodrigues*

 

          Vivenciamos tempos de muita informação, rápidas comunicações e, consequentemente, nossa “caixa de ferramentas” para a convivência social nem sempre traz utensílios apropriados para este uso.

           Já bem disse Adélia Prado que “sem o corpo a alma não goza”, verdade. O nosso corpo é a morada de nossos desejos, nossas angústias e determinações; é aí que se encontra a alma - revestida de valores - que possibilitam o gozo da vida, ou não.

          É exatamente aí, nesta “alma” guardada em um corpo, que moram os meus questionamentos: em um mundo de moralidade líquida, desejos e necessidades que se distanciam, onde o gozo da realização nem sempre está próximo aos comportamentos de alteridade, solidariedade e cidadania, como vivenciar um profissionalismo ético?

        A sociedade mundial, vivenciando a globalização econômica, política e moral, muitas vezes esquece-se que as partes – individualidades – constroem o todo que a maioria vê. Além do “jeitinho brasileiro” (poder não pode, mas sempre se dá um jeito), existe uma postura de defesa aos conceitos e normas vivenciadas em uma sociedade de princípios líquidos que tomam a forma que lhe apresentam. Isto é ético?É imoral?É preciso diferenciar ética e moral: Pois esta é um conjunto de regras estabelecido socialmente e aquela se ocupa da reflexão sobre os princípios que norteiam a vida social; assim, é questão ética discutirmos a liquidez dos valores morais.

          A dinâmica social nos atribui cargos e funções, aos quais vivenciamos mediante a valoração que fazemos ao estabelecermos relação com o objeto valorado e estabelecermos um juízo de valor; este valor está intimamente associado ao conjunto de regras sociais; temos a moral.

          Estabelecida uma dinâmica de valoração é preciso refletir sobre a crescente ideia de liquidez da sociedade política, econômica e a relação interpessoal atual. O confronto contínuo entre a moral constituída – valores herdados - e a moral constituinte – crítica aos valores ultrapassados, nem sempre garante uma progressão moral, nem uma vivência ética. Uma pessoa só justifica sua presença ética a partir do momento em que é consciente de si e dos outros; é dotado de vontade, controlando seus desejos e tendências; quando é responsável, respondendo por seus atos e, finalmente, quando é livre, dando a si mesmo as regras de conduta.

          É necessário um corpo para o gozo da alma, isto justifica a urgência do bom uso das “ferramentas” para a concretização de nossos desejos; a polêmica está no fato de que a sociedade vigente apresenta princípios líquidos que tomam formas tendenciosas, nem sempre defendidas pela maioria; maioria que se cala não por falta de informação, mas de conhecimento,  sobre o real e ideal uso das “ferramentas” da sociedade.

          A vivência ética nesta sociedade de princípios líquidos exige uma “caixa de ferramentas” que ao ser aberta traga: responsabilidade, lealdade, honestidade, sigilo, competência, prudência, coragem, perseverança, compreensão, humildade, imparcialidade, otimismo e disciplina.

           É no uso destas “ferramentas” que o sujeito ético torna-se um cidadão, um profissional que constitui uma existência ética, que independente da liquidez dos ideais a ele propostos, irá adequá-los às formatações que seus valores morais lhe apresentam.

          Saber o que está em nosso poder, não nos deixarmos leva pelas circunstâncias, instintos ou vontades alheias, afirmam nossa independência e autodeterminação – traça nossa conduta ética.

*Professora com experiência do Fundamental I à graduação, lecionou filosofia para cursos de formação de professores; especialização em psicopedagogia e mestranda em educação.



Recursos Bibliográficos:

ARANHA, Mª Lúcia de Arruda e Mª Helena P. Martins- Temas de Filosofia –    Ed. Moderna

CHAUÍ, Marilena – Convite à Filosofia, Ed. Ática, 1995.    Filosofia - Ed. Ática, 2000